Rio Bueno, 1000 km ao sul, Patagônia Norte. Para um exercício de pintura Patricia observa desde este trecho do rio um arrayán – árvore típica da região sul. A proposição inicial da artista consistia em selecionar um único microelemento, retirado do seu entorno e fazer dele um fenômeno distinto, algo que causasse as mais variadas emoções e motivasse as mais diferentes ideias. Eis o que ela quis experimentar ao deter e captar a imagem da árvore e seu reflexo na água com a multiplicidade de formas e imagens reveladas. Foi assim como começou esta série de pinturas.
Quando Patricia Claro escolhe como principal protagonista a água do rio neste trecho particular onde é tranquilo por encontrar-se justamente entre dois saltos, a motivação inicial é captar ambas as qualidades da água: o espelhamento e o movimento. “Trato de entender seu ritmo, trato de captar o que quer me entregar”. Tentar apreender as infinitas imagens fugazes que são formadas na percepção das águas e seu fluir é esse seu objetivo. Com o decorrer da série, ela percebe que há como transfundo uma motivação ecológica, já que este elemento, poderia se dizer, é o elemento mais preciso para a vida e a reprodução da civilização humana. Ao mesmo tempo há uma motivação na mera observação da natureza segundo o faziam dos grandes sábios, ou mesmo,os pintores da renascença.
Para realizar as obras Aguagrama II em pintura a artista pensou registrar desde as lentes de uma câmera varias tomas do rio. Utilizando um ponto de vista fixo,registrou a eventual caída de uma pedra, um objeto que deixou perceptível as ondas da água em expansão, até estas desaparecerem. Porém a artista registra este fenômeno em várias horas do dia, registrando as divergências tonais e o mesmo efeito, nas águas em seu fluir constante. Deste modo no resultado final se verá na sequência um jogo com as horas do dia, as diferenças perceptuais, sempre mantendo a repetição do mesmo gesto, a caída do objeto na água, mas que se encontra deslocado, para dar a passagem do tempo, mediante a passagem do rio com relação ao ponto de vista inicial.
A artista escolhe a técnica da pintura sobre linho. Emprega como pigmentos delicados e transparentes veladuras para dar o efeito da transparência das águas.Para aproximar cada vez mais ao espectador da Imagem a artista trabalha com duas dimensões fundamentais fornecidas pela visão atenta do rio. Uma é o reflexo na superfície – segundo o fenômeno da reflexão –; e a outra dimensão é aquela que aparece em certas horas do dia graças às sombras que se produzem sobre a iluminada superfície –segundo o fenômeno da refração que a água tem a propriedade de produzir.
Após idealizar a cena a representar, ela utiliza a imagem previamente captada digitalmente na fotografia, e mantendo uma escala semelhante a 1:1 a foto é ampliada. Ela faz recortes daqueles planos de cor mais obscuros (da segunda dimensão da água, dados pela profundidade do rio, tipo de corrente, o vento que provoca as pequenas ondas).
O resultado é que as camadas mais obscuras, que representariam os planos mais distantes do olho, com menos luz, ou mais profundos nas águas, são distribuídos na tela e passam a ser pintados produzindo efeitos da pingado, pontilhado, ou emulsão, mediante a mistura de veladuras verdes, amarronzados, ou qualquer outro efeito de cor que se queira dar. Uma vez secos, ela cobre essas zonas obscuras com as máscaras de papel precisamente recortadas a laser. Logo passa a pintar a segunda cor, o que seria a cor da superfície espalhada pelo restante da tela. Eis a qualidade dual da água que lhe permite transmitir um grau alto de sensibilidade ao aproximar-nos do resultado final.
Desde a primeira observação até a data da pintura Aguagramas II, 2015, se passou o período de uma década, tempo para observar a qualidade mutante da água, que como demonstra o filósofo Heráclito, o pai da dialética, é infinita, a partir da famosa frase “ninguém se banha duas vezes no mesmo rio”.
Aguagrama II apreende as infinitas imagens fugazes que são formadas na percepção das águas e seu fluir, mas seu verdadeiro objetivo parte de uma motivação ecológica, já que este elemento poderia se dizer, é o elemento mais preciso para a vida e a reprodução da civilização humana. Ao mesmo tempo há uma motivação na meditação e mera observação da natureza à maneira dos grandes sábios orientais, ou mesmo, dos pintores da Renascença.
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